Escrito por Luiz Marins
(Verão de 2002)
Estes últimos anos têm sido para as empresas, empresários e mesmo executivos e funcionários do Brasil tempos de aprendizagem do empresariar numa economia estável. Acostumadas à selvagem inflação que nos assolava há décadas as empresas e os consumidores haviam desenvolvido mecanismos de proteção que, se não eram totalmente eficazes, pelo menos faziam com que a empresa sobrevivesse.
Veio o Plano Real e com ele a estabilidade que desconhecíamos. As empresas tiveram que, novamente, se ajustar a processos novos como uma nova visão dos preços relativos, agora conhecidos pela população. Começamos a saber o que é “caro” e o que é “barato” e o povo começou a ser mais exigente, mais seletivo em suas compras, a descobrir o conceito de “valor” agregado às compras que faz.
E os prognósticos continuam bons para os próximos anos. Não há no horizonte nenhuma previsão de que a inflação volte aos níveis anteriores ou mesmo chegue aos dois dígitos mensais. O ciclo inflacionário do mundo acabou.
Um novo governo é eleito. Sem desejar a volta da inflação e da instabilidade, o povo votou num Lula que prometeu antes de tudo o diálogo, a reconquista da auto-estima do brasileiro, a volta ao crescimento econômico penalizado pelo duro remédio da estabilização. Agora é a hora de acreditar num novo Brasil que está surgindo. É preciso compreender que os caminhos da estabilidade não são fáceis, mas que estamos conseguindo coisas que não poderiam ser sequer imaginadas há alguns anos. O setor siderúrgico está totalmente privatizado. Os monopólios estatais estão caindo. A economia brasileira é grande e complexa e, portanto, essas medidas demoram mais para serem implementadas no Brasil do que nos outros países da América Latina. É bom que saibamos que todo o PIB da Argentina é equivalente ao PIB do interior do Estado de São Paulo. Todo o PIB do Chile é equivalente ao PIB do Grande Campinas e todo o PIB do Uruguai é equivalente ao PIB do bairro de Santo Amaro em São Paulo. Assim, a diferença de magnitude precisa ser compreendida para que entendamos a razão da complexidade de nossas reformas.
Os próximos anos serão ainda mais competitivos. A globalização se fará sentir ainda mais e a concorrência será cada vez mais mundial. Não estaremos mais competindo com nossas empresas da cidade, nem do Estado, nem do Brasil. Estaremos competindo globalmente. A ALCA e a integração do Brasil com o Mercosul e com a União Européia e mesmo com o ASEAN são inexoráveis.
Neste contexto, sobreviverá a empresa que tiver competência, estrutura de custos, caixa forte e pessoal altamente qualificado para produzir com qualidade e prestar o melhor serviço aos clientes e além disso, reinventar o seu setor, surpreendendo o mercado e os clientes com produtos e serviços fundamentalmente novos e diferentes.
Terá medo da concorrência a empresa que não compreender que é preciso construir hoje a empresa do amanhã. O sucesso hoje, não garante o sucesso amanhã. É preciso criar o amanhã. É preciso perguntar-se: Como será um dia típico de meu trabalho daqui a 5-10 anos? Quem serão meus concorrentes daqui a 5-10 anos? De onde virão os meus lucros daqui há 5-10 anos? O que a tecnologia estará oferecendo daqui a 5-10 anos e que poderá afetar o meu trabalho? Etc., Etc..
Estamos vendo que as empresas estão, em sua maioria, olhando para o próprio umbigo ou através de um espelho retrovisor. Poucas são as que estão construindo o seu futuro, pesquisando oportunidades de novas tecnologias e novos mercados.
É preciso que entendamos que as empresas vencedoras hoje não foram aquelas que perguntaram o que o cliente queria. São vencedoras as empresas que surpreenderam o mercado com produtos e serviços fundamentalmente novos que nem os clientes imaginavam como possíveis. Assim, a Microsoft reinventa o computador pessoal com o sistema windows. A 3M reinventa o “recado” com o “Post-it”, a TAM reinventa a aviação regional no Brasil. A McDonald’s reinventa o “fast-food” e assim, veremos que as empresas que têm sucesso hoje foram aquelas que literalmente reinventaram o seu setor. Não foram empresas que apenas fizeram melhor, mais rapidamente, com menos custo, aquilo que já faziam. Elas fizeram coisas fundamentalmente diferentes.
Vencerá a concorrência neste processo de galopante globalização as empresas que forem capazes de se reinventar, de regenerar suas estratégias e de surpreender o mercado.
Acredito, com muita certeza até, que o Brasil será nos próximos anos, uma das maiores plataformas exportadoras de produtos populares para grandes mercados como a China e Índia. Essa me parece ser a real vocação do Brasil no comércio internacional.
Assim, o que de fato muda é que não será o maior que vencerá o menor, mas sim o mais ágil é que vencerá o mais lento. É preciso ser ágil, pensar rápido e agir mais rapidamente ainda. É preciso criar mecanismos eficazes para que nossos funcionários participem ativamente dos processos de decisão, planejamento e implementação de forma positiva e proativa. É preciso criar na empresa a necessária “inteligência” para analisar dados demográficos, psicográficos e tendências futuras. É preciso conhecer cada vez melhor os mercados em que atuamos. É preciso, enfim, mudar, antes que seja tarde e mudar constantemente, pois a única certeza estável deste século XXI é a certeza de que tudo vai mudar a cada dia mais aceleradamente.
E o que a Antropologia Corporativa tem a ver com tudo isso?
Desde o australopitecus passaram-se três milhões de anos. Não houve nenhum período da história do homem em que tivéssemos tido tantas mudanças ocorrendo ao mesmo tempo. Viver, empresariar, trabalhar hoje é um desafio muito maior, muito mais complexo do que viver, empresariar, trabalhar a décadas atrás. Se esses 3 milhões de anos fossem apenas um ano, essas mudanças radicais na ciência e na tecnologia seriam os últimos 15 segundos apenas. O ser humano não é “preparado” para esse “passo” de mudança. Não há ser humano “modelo novo” para enfrentar os desafios da globalização e do ciclo de vida curta dos produtos e do próprio conhecimento. O homem hoje tem que ser um “novo homem” para poder sobreviver e vencer.
O que a antropologia corporativa faz é justamente analisar essas mudanças na vida corporativa e estabelecer, por pesquisas de observação participante, quais os “motivos” que as empresas em geral podem ter e a empresa pesquisada e cliente pode encontrar no seu conjunto de pessoas para levá-la ao sucesso. Isso é “motivação”. Motivação é encontrar os “motivos” muitas vezes escondidos dentro da cultura empresarial para fazer daquela organização um grupo harmônico, coeso, competitivo, aguerrido, inovador e comprometido. E fazer com que esses “motivos” sejam transformados em “ação” ou seja, produtos e serviços que façam da empresa, uma empresa vencedora e das pessoas que nela trabalham, pessoas realizadas, felizes.
Análises e ferramentas tradicionais não funcionam mais. Modismos em modelos de gestão acabam sendo passageiros e não trazem resultados duradouros. Sem deixar de usar todos os recursos da mais alta tecnologia e ciência disponíveis, a sensação geral é de é preciso voltar ao “básico” da simplicidade e da compreensão dos “motivos” humanos para fazer, empreender, vencer.